Se nos excluirmos a nós, viajavam no barco mais três estrangeiros: um rapaz do País Basco e mais umas raparigas que pensamos serem de origem alemã. Como nós não somos meninos de ficar calados por muito tempo, começámos rapidamente a desenvolver várias conversas, sobretudo com as crianças que por ali brincavam. Os seus pais demonstravam o seu contentamento com enormes sorrisos e pareciam aprovar a nossa atitude pois era também uma forma de manter os filhos entretidos. Pela parte que nos toca, temos de reconhecer que foi muito gratificante poder ajudar e aprender novos aspectos sobre a cultura peruana, se bem que através do olhar e sensibilidade dos mais novos. Às repetidas perguntas que nos dirigiam, respondemos não sei quantas vezes qual a nossa origem, o que fazíamos por ali, para onde dos dirigíamos, etc… O interessante nas perguntas das crianças é que querem saber tudo, sem complicações ou constrangimentos. A curiosidade das crianças é um espectáculo!
Outro aspecto não menos interessante da vida a bordo tem a ver com a hora das refeições. Chegado o momento, os cozinheiros batem efusivamente com uma colher numa panela, em jeitos de dizer que a comida está pronta. Segue-se a enorme fila, onde todos se colocam ordeiramente com os tupperwares e bilhete de viagem, a fim de receber a correspondente refeição. Apesar das limitações próprias do espaço, temos de dizer que não nos trataram mal com a qualidade geral da comida, ainda que na maior parte dos casos fosse reduzida em quantidade.
Ainda durante a primeira noite chegamos a pensar que o barco estava a ser tomado por uma espécie de “piratas do Amazonas”. Mas não! A razão de tal movimentação deveu-se apenas ao facto de pararmos numa aldeia. E sempre que assim é, há irremediavelmente uma grande algazarra com vendedores aos gritos para tentarem a sua sorte com a venda de um qualquer produto. Nestas paragens há sempre um grande entra e sai de pessoas, e, por isso, fomos avisados para termos muita atenção com os nossos haveres. Neste sentido tomámos algumas precauções, nomeadamente com a instalação de uma terceira rede para as mochilas, que há noite eram cobertas com toalhas e envolvidas em cordas. Não sabendo se a solução foi o mais adequado, o certo e que desta maneira dormimos muito mais descansados.
Do ponto de vista sociológico há também a sublinhar o facto de esta viagem ser absolutamente fantástica. É extraordinário como em apenas quatro dias de viagem todos acabam por se conhecer e partilhar as vivências diárias. Com uns joga-se às cartas, com outros tomam-se as refeições, fala-se de política, história, gastronomia ou, como não podia deixar de ser, o tema que está sempre presente na boca de todos: o futebol. Depois há os cozinheiros, os trabalhadores, o mestre, o capitão e as crianças, das quais já tivemos oportunidade de falar. São dias especiais aqueles que se passam num único espaço de 60 por 8 metros, onde se come, socializa, ouve-se música, vêem-se filmes ou aproveita-se para ler, sempre na companhia de uma paisagem maravilhosa, que parecer infinita e se agiganta perante os nosso olhos incrédulos: a Sra. Amazónia e o Sr. Amazonas. Cada pôr-do-sol é único e as cores da aurora também têm o seu encanto. Mesmo com todos os atrasos que tivemos no decorrer desta viagem, valeu muito a pena. Agora já podemos dizer: a troca da viagem de avião por barco foi o melhor que podíamos ter feito.
Chegamos a Iquitos prontos para mais uma aventura no interior da selva. Que venha agora o calor porque já está na hora de aparecer. Definitivamente acabou-se o frio. Está aí o Verão!
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