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New York, New York. Alguns dias na cidade que nunca dorme.

Se está com falta de tempo, eis New York numa frase: Empire State, Estátua da Liberdade, Times Square, Central Park, Ground Zero e a 5ª avenida. Este é o tour japonês, que faz parte da volta ao mundo numa semana e acaba invariavelmente na Louis Vuitton. Para quem tem mais uns dias, no entanto, Nova Iorque é uma cidade fascinante — mas num sentido ruidoso, poluído e caótico, sem o charme fácil de Paris ou as ruínas da capital italiana. Aqui não existem quase monumentos, por isso, esqueça as igrejas barrocas ou os palácios da monarquia centro-europeia. Se Nova Iorque tem algum encanto, este provém-lhe da energia electrizante que se vive nas ruas, do comércio desenfreado, do turbilhão de gente, da rapidez com que tudo se move.

Manhattan

Em qualquer local dos Estados Unidos, o turista sente que está dentro de um filme. Em Nova Iorque, esse filme foi realizado por Woody Allen. Aqui tudo parece familiar: os táxis, o fumo nas condutas do metro, os edifícios dos anos trinta, a Drew Barrymore num Starbucks. Tudo nesta cidade parece um lugar-comum — o que facilita muito o trabalho dos japoneses.

A 5ª Avenida é uma espécie de centro nevrálgico dos cartões de crédito, para onde convergem multidões. Foi aqui que Henry Vanderbilt construiu a sua mansão em 1883, imitado por famílias poderosas como os Astor. E aqui se vieram instalar casas como a Cartier e a Tiffany, a Gucci, a Fendi, a Prada, os armazéns Sak’s Fifth Avenue, a Armani Exchange, entre outras lojas para pessoas normais.

Nada disso é tão cintilante como a Trump Tower, cheia de mármores e dourados, ou tão memorável como o Rockefeller Center. Com lojas, escritórios, restaurantes, entretenimento e jardins, foi construído entre 1931 e 1940 por John D. Rockefeller Jr e hoje é onde se reúnem todas as boas almas em Dezembro, quando as iluminações de Natal são colocadas e o ringue de patinagem fica repleto de gente de todas as idades a deslizar ao som de músicas típicas da época.

Aqui, no centro de Manhattan, coabitam os mais importantes marcos da cidade — e quem diz marcos, diz arranha-céus. É impossível ignorar o edifício Chrysler, uma torre art déco de aço inoxidável ornamentada com tampas de radiador, volantes, automóveis e gárgulas, que foi construída para ser a sede, evidentemente, da Chrysler. Um pouco mais a sul, o Empire State Building, o arranha-céus mais famoso do mundo permite-lhe subir até ao terraço de observação no 86.º andar, onde Cary Grant um dia esperou por Deborah Kerr e as pequenas Asuzas perdem os sentidos com tanta emoção.

Os apaixonados pela arquitectura devem visitar a Grand Central Station, a célebre estação de comboios que serviu de cenário a mais do que um filme de Hitchock. A estação recebe diariamente um milhão e meio de pessoas sob as altíssimas abóbadas e nas escadarias de mármore inspiradas pela ópera de Paris.

Depois chega a hora de visitar Times Square, com as luzes e os cartazes coloridos da Broadway. O turbilhão atinge o auge nesta área da cidade. Cartazes e néons iluminam a noite, as músicas de fundo ensurdecem, e vários artistas exibem-se no passeio. Está na altura de ver um musical —  e de certeza que reconhecerá um nome famoso num nos cartazes.

A estátua da liberdade foi construída por França e foi inaugurada em 1886.
© Alonso Javier Torres ( CC BY 2.0 )

A Village

Ali perto fica a Greenwich Village, ou apenas Village. É outra Manhattan, com uma arquitectura própria, prédios baixos, praças e pátios arborizados, mais acolhedora e descontraída — a zona boémia da cidade.

Em 1820 existia aqui um vilarejo repleto de imigrantes irlandeses, italianos e negros. Depois, um vasto número de artistas instalou-se no local que era barato e animado. Walt Whitman, Anais Nin, Jack Kerouac e Allen Ginsberg são apenas alguns dos nomes que merecem uma recordação.

A New York University, com vários quarteirões em redor da Washington Square, permitiu manter o ambiente boémio. Ao seu redor abundam os restaurantes e cafés entre prédios de tijolo vermelho, ruas ladeadas de árvores, e uma atmosfera de aldeia para gente alternativa. Os yuppies misturam-se com os cyber-punks, as drag queens, os dealers, os publicitários e as modelos. Nasceram aqui alguns dos bares e restaurantes mais reputados de Nova Iorque.

Mesmo ao lado fica Chelsea, a zona das galerias e do Dia Center for the Arts — antiga fábrica desactivada onde expõem os nomes mais famosos e promissores das artes plásticas.

É indispensável visitar o Hotel Chelsea, que acolheu Tennessee Williams, Arthur Miller, Sam Shepard, Janis Joplin, Patti Smith, Al Pacino e muita gente que se tornou famosa. Andy Warhol filmou aqui Chelsea Girls, e o hotel ainda hoje é habitado por actores, músicos, pintores e gente de feitio difícil.

SoHo

A sul de Greenwich Village, uma antiga zona fabril foi ocupada por artistas a partir dos anos 70, transformando lofts em ateliers. As galerias, as lojas, os restaurantes e os cafés ocuparam o local que se tornou moda. Hoje é a morada de burgueses endinheirados e madames com aspirações à modernidade.

Mas a dois passos existe algo verdadeiramente interessante: a maior aglomeração de chineses fora da China. Com 150 mil habitantes, Chinatown está em expansão para a vizinha Little Italy e para o bairro judeu de Lower East Side. A Canal Street, em que abundam as falsificações de carteiras e relógios, é uma espécie de Babilónia asiática e uma grande oportunidade para ir às compras.

Ground Zero

Se caminhar para sul entra na Lower Manhattan, a capital financeira da cidade. Situa-se nesta área o Federal Reserve Bank, a famosa Wall Street e o New York Stock Exchange. Mais importante ainda: é aqui que fica o Ground Zero, o local em que caíram as torres gémeas a 11 de Setembro de 2001.

Pelo gradeamento podemos espreitar para o gigantesco buraco, e apreciar as obras do que vai ser o novo World Trade Center. É impressionante verificar como a cidade retomou a sua vida normal após a tragédia. Hoje, a zona enfrenta um cataclismo financeiro sem paralelo desde 1930.

Ponte de Brooklyn sobre o East River.
© Simone Roda ( CC BY 2.0 )

Outras atracções em New York

Os programas para quem passa uns dias em Nova Iorque não acabam. Pode embrenhar-se em Central Park e visitar o Guggenheim, ou abrir a boca com a monumentalidade e o acervo do Metropolitan Museum.

Ou então, atravesse a pé a Ponte de Brooklyn. Do outro lado, existe uma nova cidade, que é a coqueluche nova-iorquina do momento: aqui situam-se os novos bairros da moda. O escritor Paul Auster nunca saiu da região desde que chegou do sul de França.

Também Queens, um sítio até há pouco violento, se civilizou: hoje pode ver mais arte aqui do que em todos os Estados do Sul. E até o intratável bairro do Harlem recebeu o ex-presidente Bill Clinton de braços abertos: os taxistas que se recusavam a entrar em certas ruas conduzem hoje os donos do mundo a condomínios de luxo e a restaurantes absurdamente caros.

Nova Iorque é uma Babilónia: 30% dos habitantes nasceram no estrangeiro e falam todas as línguas da ONU. Essa é a verdadeira fonte de prazer da cidade: por isso, sente-se na montra de um café, peça um cappuccino e veja o mundo a passar. O espectáculo nunca acaba. É histriónico, divertido, trágico e comovedor. A sua variedade infinita toca-nos, por vezes brutalmente, com uma estranha familiaridade. Para isso não há palavras, só recordações.