Esta fotografia foi realizada em Sal Rei, na Ilha da Boavista, em Cabo Verde, no ano de 2005. A história que está por detrás da sua origem poderia ter variadíssimas origens ou enredos, mas o certo é que está apenas centrada na actividade normal de um dia de escola.
Como muitos saberão, o tempo e o rigor dado às coisas em África, sobretudo nas actividades do dia-a-dia, nem sempre segue os padrões a que estamos habituados na Europa. Em muitos casos, as coisas decorrem como têm de decorrer, sem grandes pressas ou complicações. A história que se segue é um destes casos.
Num descontraído passeio matinal, sem grandes expectativas fotográficas pelo número de dias já acumulados na ilha, vislumbro, meio por acaso, uma pequena escola constituída por três edifícios degradados, que embora construídos sobre paredes de alvenaria, apresentavam-se descascados de tinta e cobertos por chapas de zinco. Aproximo-me ao mesmo tempo que uma mulher me ultrapassa em direcção a uma das portas, onde acaba por bater efusivamente e exclamar um conjunto de palavras num crioulo incompreensível. Segue-se um compasso de segundos, suficientemente prolongados para esperar pela abertura da porta, desenvolver uma troca fixa de olhares e exprimir mais umas quantas palavras que mais pareciam a vocalização de uma melodia. Apressadamente, as duas mulheres afastam-se em direcção às traseiras da escola, sem que mais nada as preocupasse ou desviasse as suas atenções. Fiquei na expectativa que algo de importante se deveria estar a passar, mas o certo é que nada vim a saber.
Entretanto começam os risos, gritos e tropelias várias, rapidamente seguidos de um crescente número de crianças que se transferia da sala para o terreiro, onde eu me encontrava como simples espectador aquela inesperada situação. Em muito pouco tempo estava-se perante uma autêntica hora de recreio. Não menos curiosa foi a quase indiferença à minha presença, pois à excepção de uns momentos iniciais de maior timidez, só mesmo quando apontava a câmara fotográfica era demonstrada uma certa desaprovação. E é no meio desta agitação, enquanto fotografava miúdos que corriam atrás de uma bola feita de farrapos, que desenvolviam brincadeiras pouco perceptíveis para o meu entendimento ou, simplesmente, procuravam impor a lei do mais forte, que reparei numa rapariga que chorava junto a uma parede, enquanto outras crianças lhe batiam ou troçavam dela. Tive apenas tempo para fazer 2 ou 3 fotografias até darem pela minha presença. E se é certo que acabaram por fugir, incluído a rapariga fotografada, ainda mais certo é que contribuíram para deixar registada uma fotografia que conta uma história real, mas que poderia ser desenvolvida no imaginário de cada um. Com o regresso da mulher que se encontrava na sala, e que só depois percebi ser a professora, impôs-se a pergunta: “o que é que o senhor está aqui a fazer?”. Sorrateiramente, e enquanto me dirigia novamente à estrada para prosseguir caminho, apenas respondi: “ando a conhecer Cabo Verde e as suas maravilhosas histórias do dia-a-dia”.
Cabo Verde pode ser um país fascinante desde que o queiramos descobrir. Para além das belas praias, que cada vez mais arrastam um infindável número de turistas para as ilhas do Sal e da Boavista, há imensos recantos por explorar e pessoas que perante a sua enorme generosidade, podem ser o centro de histórias verdadeiramente ímpares.
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