Uma coisa é praticamente certa na tua próxima viagem: vais querer tirar muitas (e boas) fotos. A viagem, pelo menos para mim, é indissociável da fotografia. E a fotografia é indissociável do retrato. O melhor das viagens são as pessoas, isso é um dado adquirido antes de partir para o próximo destino. São sobretudo elas, e não os lugares, que fazem uma viagem e que nos contam a(s) história(s) vividas. A fotografia é a melhor forma de contar a sua história, mas, tal como as histórias, também uma boa fotografia, especialmente um retrato, exige preparação. Atrevo-me a juntar aos três T’s fundamentais da fotografia (Técnica, Talento e Trabalho), os meus três P’s: Preparação, Paixão e (muita) Paciência. Estão todos interligados. Basta ignorares um deles e a tua fotografia poderá estar comprometida. Estes elementos decisivos refletem-se em várias técnicas para captares melhores retratos. Compilei-os num total de 15 dicas, ilustradas por imagens que fiz na Índia, um daqueles países onde é imprescindível registar momentos inesquecíveis através do retrato.
Pede permissão
É de bom-tom pedir sempre permissão para fotografar alguém. Põe-te na pele da pessoa fotografada sorrateiramente e sem permissão e lembra-te do “Não faça aos outros aquilo que não gostaria que fizessem a si”. O pedido não precisa de ser verbal. Aliás, raramente o faço verbalmente. Opto quase sempre pelo pedido não-verbal, através de um olhar, de um aceno, de um sorriso. Isto resulta, pelo menos para mim, em 90% das vezes que quero retratar alguém.
Sorri
O mundo tem uma maravilhosa diversidade de “mundos”. Também um sorriso. Sorrir é a melhor forma de pedir permissão e de criar empatia com o retratado. Raramente alguém recusa que lhe tire uma fotografia se eu lhe sorrir. Obviamente é sempre preciso algum bom senso. É inevitável cruzares-te com pessoas que se nota de imediato que não estão “ a fim” de serem fotografadas.
Envolve-te
Vence a timidez e mistura-te com os locais. Esta é uma regra de ouro para se conseguir um bom retrato. Vai para o meio das multidões, visita mercados, feiras, festas, todo o tipo de eventos. Estabelece contacto e arrisca fotografar. Lembra-te do sorriso. Troca hotéis e restaurantes caros e impessoais por pequenos negócios familiares. Fica alojado em casas de famílias por exemplo. A cumplicidade que nascerá entre todos facilitará a comunicação e, por sua vez, permitirá captar melhores imagens.
Tem paciência
Não te fiques pelo óbvio. Estuda, espera, dispara. Tirar bons retratos exige tempo e muita perseverança. Disparares a câmera como uma metralhadora “ao calhas” não é sinónimo de, quando descarregares o cartão, teres boas fotos. Olha à tua volta, estuda as pessoas, antecipa os seus movimentos, espera que ela entre no teu enquadramento, aproxima-te, recua, analisa. Isto exige tempo e experiência, mas os resultados acabarão por falar por si.
Explora as zonas menos turísticas
Não deambules apenas pelas zonas mais turísticas. Há certos países em que essas são precisamente as zonas menos genuínas, onde os locais estão mais saturados de serem fotografados ou onde pedem dinheiro para o serem. Quanto mais afastado do epicentro turístico, mais espontaneidade conseguirás nos retratos.
Se possível, contrata um guia
Ter um guia local a acompanhar-te e a orientar-te é uma das melhores formas de conhecer pessoas. Já tive alguns guias que me apresentaram a sua família e amigos, me levaram a sítios pouco explorados e, com isso, me possibilitaram conseguir melhores imagens.
Não sejas um “stalker”
É muito comum, quer pela timidez, quer pela preguiça, quer pela falta de tempo, “perseguir” pessoas sorrateiramente e tentar fotografá-las sem que elas dêem conta. Além de arriscar-se que a pessoa “tope”, e daí surja um berbicacho, os resultados de ser um “stalker” não serão tão bons. Não vou dizer que nunca o fiz. Já o fiz e com alguns bons resultados, mas nada como aproximares-te da pessoa, criar empatia e registar essa relação – mesmo que fugaz – numa fotografia.
Não dês dinheiro
Esta é uma questão sempre controversa. Dar ou não dinheiro a pessoas que o pedem depois (ou antes até) de serem fotografadas. Uns defendem que tem todo o sentido pagar a alguém que “fez de modelo” por assim dizer, que despendeu o seu tempo para ser fotografado. Por outro lado, outros defendem que isso cria um autêntico negócio, em que, por exemplo, crianças são exploradas para pedirem esmola à custa da sua imagem. Já me deparei com ambas as situações. É preciso usar o bom senso. No meu caso, sempre que me apercebo que alguém o faz apenas por dinheiro, rejeito fotografar essas pessoas.
Dá dinheiro
Não, não me vou contradizer. O que quero dizer é que podes aproveitar o facto de teres pago para comprar algo e conseguires uma boa foto com isso. Essa é uma das técnicas que mais uso em viagens. Quando compro alguma coisa, seja uma fruta a um vendedor ambulante ou um guia de um “tour”, aproveito o elo criado (mesmo que superficial) e peço para tirar uma fotografia. É uma troca justa, em que ambos saem beneficiados, desde que ambos concordem em fazê-lo, obviamente.
O melhor zoom são os teus pés
Sim, com uma teleobjectiva conseguirás tirar algumas fotos interessantes de pessoas a uma distância “higiénica”. No entanto, os melhores retratos implicam chegar-se perto do retratado, criar a necessária empatia, estabelecer um elo. Até porque, como dizia o famoso fotógrafo Robert Capa, “se as tuas fotos não são boas o suficiente, então é porque não estás perto o suficiente“.
Sai cedo, chega tarde
A luz da manhã e do final de tarde são amigas da fotografia. Isso é uma realidade na fotografia de paisagem, mas também no retrato. A luz difusa (mais amarelada de manhã e mais azulada no final de tarde) dará outra riqueza de tonalidades e sombras às tuas imagens. Em relação ao flash, usa-o com cautela, já que a maioria das vezes os resultados vão ser insatisfatórios. Ao contrário da crença comum, o flash não serve para ser usado à noite (salvo algumas excepções), mas sim como luz de preenchimento durante o dia (por exemplo: iluminar alguém que está contraluz em relação ao pôr-do-sol).
Explora todos os ângulos
Não uses apenas uma teleobjectiva (ou zoom) e um ângulo frontal. Se tiveres essa possibilidade, usa todas as objectivas e distâncias focais (ou zoom) que tiveres disponíveis. Não existem objectivas inadequadas para retratos. Explora tanto as teleobjectivas, como as “olho de peixe”, grande-angulares, etc. Experimenta todos os ângulos também. Baixa-te em relação ao retratado (plano contra-picado), sobe para cima de muros, escadas e afins (plano picado) e dá asas à imaginação com todos os ângulos que te lembrares.
Aprende a abrir o diafragma
O da câmera, pois claro. Quanto maior for a abertura do diafragma da objectiva, mais luz entra no sensor da câmera e menor será a profundidade de campo. Ou seja, mais desfocado ficará o fundo (o chamado “bokeh”), o que é perfeito para retratos. Numa câmera reflex, um diafragma aberto pressupõe usar um número mais baixo nos valores f/, tal como f/2.8 ou f/4. Caso tenhas uma câmera mais básica ou (ainda) não domines a câmera a 100%, usa o modo retrato.
Concentra-te no olhar
O teu é importante sim, mas o dos outros ainda mais. Como se diz por aí, os olhos são os espelhos da alma. São eles que transmitem sensações e, em última análise, histórias. Por isso, usa sempre o foco nos olhos. Cuidado no entanto com a questão do diafragma aberto. Como dito anteriormente, quanto maior abertura menos a área de foco (profundidade de campo) e maior o risco de um engano e focar, por exemplo, no nariz.
Esquece tudo o que escrevi
As regras são para ser quebradas. Uma boa fotografia não depende apenas da técnica. Uma câmera não faz um fotógrafo, nem uma objectiva. Uma má câmera, com uma má objectiva, em modo automático, usada por alguém sem experiência pode resultar num excelente retrato. Lembra-te disso na próxima viagem e boas fotos!