Avaliação do editor
A Charrette, que dispõe de uma carta abundante em pratos da região, é um espaço que prima pela qualidade da confecção e atendimento.
Se há lugares que parecem estar predestinados para o deleite das papilas gustativas e prazeres do espírito, que naturalmente ficam na história pelo arrojo, competência e capacidade em preservar as tradições genuínas da serra, o restaurante A Charrette é indubitavelmente um destes lugares. Trata-se de um templo destinado ao culto gastronómico e ao melhor que os magos da cozinha Monchiquense têm para oferecer, facto comprovado pelos vários galardões já alcançados, onde se conta o recente prémio “Restaurante do Algarve,” atribuído pela Confraria de Gastrónomos da região.
Fundado em 1978, através do esforço e perseverança de José António Pedro, nas antigas instalações de uma mercearia, onde curiosamente havia trabalhado enquanto jovem, o restaurante A Charrette apresenta-se com um espaço constituído por duas salas de paredes lisas e com uma decoração marcadamente rústica e acolhedora. Na primeira sala, logo à entrada, posiciona-se um grande balcão de madeira, acompanhado por um conjunto de cadeiras milimetricamente alinhadas e iluminado por lampiões pendurados em correntes que descem do tecto. Na parte traseira, a parede de cor bordô é talvez o elemento que mais chamará a atenção, mas rapidamente o olhar é centrado nos dois grandes rodados de carroça que claramente se encontram a desafiar as leis da gravidade. Ainda na mesma sala, ao fundo, não podia deixar de se destacar um comprido e bem recuperado armário, com enormes portas de vidro, que outrora serviu para a arrumação dos produtos comercializados na “defunta” mercearia, e hoje, está ao serviço de uma interessante colecção de finas porcelanas. Seguindo para a segunda sala, consideravelmente mais esquia e onde a iluminação natural é mais escassa, talvez mereça nota de reparo o belo tecto de madeira, responsável por um ambiente mais acolhedor e intimista. Aqui, a decoração está mais focada nos tradicionais utensílios e artefactos, que em tempos foram utilizados pela população de Monchique, nas mais diversas actividades, e que agora se encontram abundantemente distribuídos através das paredes. Há ainda a destacar a zona de transição entre os dois espaços de refeição, onde uma curiosa colecção de relógios de parede, muito bem alinhados e quase todos ligados às mais diversas marcas de bebidas, nos deixa desde logo com uma excelente impressão: o tempo aqui passado será seguramente revelador de experiências a registar para a posterioridade.
Depois de sentado e antes de se aventurar por caminhos onde seguramente vai gostar de se perder, poderá vaguear através na infindável ementa que o deixará perplexo com tamanha abundância. Para começar arrisque com a prova de alguns dos petiscos que a tradição teimou em preservar: as azeitonas à Monchique; o mólho, que é um bucho recheado com sangue, carne e arroz; o lombo de porco na banha, que resulta numa interessante forma de refrescar e acentuar o sabor de uma carne extremamente suculenta; a tábua com enchidos de porco preto, onde reinam a chouriça assada e a morcela de farinha (uma espécie de farinheira); ou o presunto de Monchique curado no sal. São apenas alguns dos nomes que pode reter da infindável lista de entradas, onde a principal dificuldade é mesmo a escolha.
Voltando à emblemática ementa, que para os assíduos talvez se revele pouco dinâmica, prepare-se para novas dificuldades, sobretudo pelo sugestivo conjunto de nomes que lhe são apresentados. Não menos importante é a obrigatoriedade em reservar, desde já, um espaço para as sobremesas. Lá chegaremos. Digna de registo, a Assadura é um prato de lombo de porco excepcionalmente grelhado, facto comprovado pela suculência e tenrura da carne servida, que depois é fatiada e temperada por um molho feito à base de azeite, alho, salsa e limão; o Cozido de Couve atinge um nível de sabor difícil de quantificar, ao qual não será alheio a utilização da costela de porco preto, salgada prolongadamente antes da cozedura, bem como dos enchidos que têm tudo para ser o orgulho de quem tão delicadamente ousou produzi-los. Seguem-se a Galinha com Amêndoas, o Feijão com Arroz, a Calatróia, as Costeletas de Javali, o Cabrito Estufado à Charrette, o Churrasquinho de Porco Preto, os Milhos com Feijão, o Cozido de Grão e mais um rol de iguarias que merecem tempo e vontade para uma prolongada degustação. Estão também disponíveis carnes de vaca, borrego e porco preto, essencialmente destinadas à grelha, onde podem ser aplicados vários cortes para bifes, costeletas, espetadas e até para uma bela Posta Mirandesa. Em caso de dúvida, não há problema. Escolha qualquer uma das propostas. Surpreendentemente verá que acertou em cheio no prato que procurava. Para os mais dados aos prazeres do sabor do mar, as Lulas Recheadas à Monchique, outra das especialidades da casa, é também uma das criações que não permite remeter a gula para destinos além-fronteiras. O peixe fresco, proveniente dos mares que se avistam da serra, é variado (bacalhau, linguado, peixe-espada, cherne, corvina, robalo, ou salmonete) e está disponível para cozer, grelhar ou fritar.
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