Fui até lá de moto para sentir que ao subir a serra se ia entranhando. Chegado ao topo, que regista 666m de altitude, é impossível ficar indiferente ao que se vê, sem querer saber mais sobre os pormenores.
Nesta visita pouco pensada e muito espontânea, fiquei surpreendido com o que vi. Não será a primeira vez que sinto isto. Os tesouros vivem por ali, tantas vezes a pedir para serem visitados e tantas vezes sem uma resposta que sirva a tão bela relação que se apresenta. É que neste particular há que ter em conta a beleza, função e necessidade de em tão inóspito sitio, haver a ousadia de construir tão belas coisas.
Há uma fábrica de Gelo – “A Real Fabrica do Gelo” – que não pode mesmo deixar de ser mencionada como fabrica, pois para além da produção, passava por um processo de recolha com características tão únicas que durou para lá do tempo previsto, fabricando e preservando o gelo, um bem precioso que à época serviu a corte e mais tarde outros locais conhecidos da nossa Lisboa.
Conhecem o Martinho da Arcada? Fernando Pessoa foi refrescado por motivos de tanta exaltação em génio, que é muito improvável que um destes blocos de gelo não fosse proveniente desta Real Fábrica… Pessoa terá certamente testemunhado o descarregamento de gelo para servir as arcas térmicas do Martinho da Arcada, um dos seus espaços de eleição.
Aconselho pois vivamente uma visita a esta “A Real Fabrica do Gelo”, sempre com olhos de ver e sem tempo contado. Para os amantes da imagem, as fotografias são uma boa ideia, pois há por aqui momentos de especial cor e luz que podem ser retidos pelos mais habilidosos na arte de captar boas imagens. Outras sugestões passam pela visita às ruínas do convento começado e do convento terminado, os fornos de cal, os imensos trilhos espalhados um pouco por toda a serra e o café que serve as vontades de quem passa. A Serra de Montejunto, que é uma estrutura geológica com 15km de comprimento e 7km de largura, é ainda rica em algares, grutas, pequenas lagoas e inúmeros vestígios de fósseis pré-históricos.
As soluções e opções de visita são tantas que a possibilidade em passar uns dias no parque de campismo rural da Serra de Montejunto é também uma opção a ter em conta. Serão certamente noites com espaço para colocar em prática as ideias e preservar as imagens retidas da serra.
A serra tem ainda para nos apresentar um vendedor ambulante, que faz o favor de parar no cruzamento que serve o topo da serra, e que com a sua camioneta, de laterais abertas, apresenta um conjunto alargado de produtos ao estilo de uma mercearia antiga. Será talvez aquilo a que hoje alguns chamam de gourmet…
Eu sei que poderia sugerir um roteiro, falar dos caminhos ou especificar, por exemplo, que ao quilómetro “tal” é possível encontrar um determinado ponto de interesse. Era possível fazer um roteiro dependente de um mapa e GPS, onde todos seriam uma espécie de “Coronel Tapioca” guiados por pontos e coordenadas, sempre sob o que a minha perspectiva deixasse passar e que a vossa intenção deixasse interpretar. Mas eu prefiro de outra forma: agrada-me mais a ideia de falar sobre o que há, algumas vezes até para lá do que eu reconheço ou do que eu vi, deixando ao critério de quem gosta de viver descobrindo, sem tempo ou preconceitos.
Vir a Montejunto obedece a um agasalho no Inverno e roupa transpirável no Verão; obedece a uma visita ao posto de turismo e um bom dia a quem lá estiver com o intuito de comprar o ingresso que, por dois legítimos euros, possibilita perceber a dinâmica da “Real Fábrica o Gelo” e muitas outras curiosidades que há na serra por descobrir.
Para acabar deixo algumas curiosidades para as quais seguramente vão querer obter resposta.
- Qual foi a Ordem Religiosa que prevaleceu com este clima tão rigoroso e deixou tantas marcas na serra?
- O que faz desta “Real Fabrica do Gelo” um local tão singular, destacando-se dos muitos neveiros que à época brotavam pela Europa e pelo Mundo?
Como chegar à Serra de Montejunto?
A Serra de Montejunto situa-se a pouco mais de 60 quilómetros de Lisboa, entre os concelhos de Alenquer, a sul, e Cadaval, a norte. O acesso a este maciço pode ser feito através da auto-estrada A1, usando a saída de Aveiras de Cima (saída nr.5), ou em alternativa a auto-estrada A8, através das saídas de Campelos (saída nr.10) ou do Bombarral (saída nr.11), tomando depois a direcção Cadaval.