PEste foi o teu primeiro programa de televisão. Como é que correu a experiência?
RForam todas as emoções que haja no cardápio ligadas à adrenalina. Comecei por só ter três dias disponíveis para gravar o primeiro programa da minha vida, em lugar dos sete previstos – o vulcão islandês quis dar o seu contributo para e me obrigar a fazer quatro escalas antes de chegar a Malta. Depois, logo no primeiro take, o realizador dá voz de acção e eu fico a olhar para a câmara a pensar – “tirem-me deste filme” (risos). Estamos a falar de um timing, de uma exactidão, de um rigor de palavras, que na escrita vou conseguido naturalmente, mas que ali contribuíram para um bloqueio petrificante.
PTu que habitualmente estás habituado a “falar para folhas de papel”, foi muito diferente falar para uma câmara de televisão?
RQuando escrevemos ou falamos para uma entrevista, mesmo tendo um gravador pelo meio, as coisas são naturais e espontâneas. Já em televisão, e fazendo uma ponte com a musica, é necessário saber e memorizar a pauta, ter noção das notas, sentir e sobretudo conseguir interpretar. É isto que conta na hora de falar para uma câmara de televisão. Mais do que a massa de texto construída para aquela fala, o importante é como soam as coisas… É preciso soar a verdade!
PVai haver uma segunda série do programa, desta vez toda gravada no Brasil. Queres falar-nos um pouco sobre isso?
RVamos fazer a série toda naquele país, porque o Brasil é um continente; porque há uma afinidade mesmo com o “desacordo ortográfico”; porque é o país mais visitado pelos portugueses; porque é o país das simpatias, dos amores, dos afectos ou que toda a gente acha que conhece. Eu vou tentar provar, até a mim próprio, que não conhecemos patavina. Durante pouco mais de três meses vamos passar por nove estados e em muitos casos as pessoas que me lêem, vão ver que aquelas personagens ou objectos existem mesmo. O embaixador de Fernando Noronha, que tem um calhau chamado “o tesão” existe… o calhau que está no quintal existe… (risos). Nesse episódio faço questão de filmar o calhau e esfrega-lo em louvor à tesão deste mundo (risos).
POs locais já estão todos definidos?
REstão e não há como escapar a isso. Antes de sair de Portugal a logística tem que estar toda preparada. Vou começar no Rio Grande do Sul e acabar no Rio de Janeiro, mas em ecrã o programa vai acabar na Amazónia. Seria impossível fazer coincidir o calendário de exibição com o das gravações, porque as condições climatéricas seriam adversas e impossíveis. Vamos passar pelo Pantanal, Belém, Manaus, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Goiás, Mato Grosso, Amazónia… Vai ser maravilhoso e espero acabar a série a jogar à bola com o Chico Buarque.
PE após a conclusão deste projecto, há já outros na calha?
RTenho um livro para lançar ainda este ano… Ainda não sei quando, pois só regresso em Dezembro da segunda fase de gravações. Vamos ver… Talvez antes do Natal…
PMas já está preparado?
REstá escrito e os desenhos são do maravilhoso cartoonista Vasco de Castro. O livro chama-se “O Baú Contador de Histórias” e é uma primeira incursão na ficção. Embora seja um livro onde já ando a trabalhar há perto de uma década, não é nada de muito volumoso.
PQue conselho podes dar às pessoas que se sentem amedrontadas, com um espírito onde abunda a desconfiança e que se inquietam com o que podem encontrar durante uma viagem?
REu diria que é preciso ir, nem que seja só pela curiosidade de vermos o que há por esse mundo fora. Depois há o património e as relíquias portuguesas das quais falamos sempre com tanta nostalgia do que já fomos: o legado que deixamos em quase todo o mundo é qualquer coisa de extraordinário e maravilhoso. O português é um viajante natural… é uma questão geográfica… é empurrado para isso.
PEstará isso marcado no nosso genoma?
RAcho que sim! É uma condição e uma inevitabilidade. Isto sempre foi a sina do português, seja por necessidade ou aventura. Sempre houve aqui uma certa dose de loucura, ousadia e pioneirismo no desbravar de novos mundos.
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