O ferry, que nos iria devolver novamente à ilha de Manhattan, partiu do cais de embarque de Liberty Island, parecendo um poldro que escoiceia e esbraveja quando sente o bridão. Foi apenas uma fase inicial de alguma turbulência, pois as águas mansas do rio Hudson rapidamente se encarregaram de nos trazer alguma tranquilidade. E não falo de grande tranquilidade porque houve um senão: “ter de levar com a conversa” de meia dúzia de brasileiros, logo por azar sentados ao meu lado, que três dias antes tinha ido a Boston ver o jogo de futebol entre as selecções de Portugal e Brasil. É certo que os portugueses perderam por 3-1, mas pela conversa acho que os brasileiros acreditam que ganharam por bem mais. Enfim, conversas de amantes do futebol. Há que dar um desconto! Passava pouco do meio-dia quando atracámos em Battery Park, plena zona sul de Manhattan.
Quando num dos textos anteriores vos falei do percurso de Queens a Manhattan, já tinha referido que o Battery Park está instalado num antigo aterro sanitário, mas nada referi sobre a origem do nome. Tal denominação deve-se à bateria de canhões ali colocada pelos holandeses para defenderem a Nova Amesterdão, que à data servia de sede colonial quando os mesmos se estabeleceram na região – durante o século XVII. Hoje é um magnífico local de paz e destinado ao lazer, estando por isso englobado na rede de parques e monumentos nacionais dos Estados Unidos da América.
Já sem grande energia, devido ao elevado calor que se fazia sentir, ainda encontrámos forças para fotografar mais alguns monumentos, nomeadamente junto à Estátua do Emigrante, uma obra do escultor espanhol Luis Sanguino. Não muito longe deste lugar, agora abrigados pela frescura das sombras das árvores que orlam a The Fountain at Battery Bosque Park, observámos e registámos para a posterioridade alguns petizes correndo, dançando e brincando, sempre por entre os jactos de água que emanavam do chão da fonte. Como dizia Oscar Wilde, a única maneira de tornar as crianças boas é torná-las felizes. E nós estávamos felizes!
E foi logo ali que resolvermos sentar-nos para descansar um pouco e eu escrever algumas das linhas que hoje decidi partilhar. Também aproveitei para reflectir um pouco sobre os pequenos diálogos que tive oportunidade de travar com alguns americanos e, contra as minhas próprias expectativas, concluo que hoje já conseguem olhar para nós, portugueses, de uma maneira bem diferente, talvez mais respeitosa e acolhedora. É certo que de uma forma meio matreira, mas quem diria que eu iria fazer sorrir alguns americanos com as minhas piadas!? Pode ser impressão minha, mas parece-me um povo mais feliz. A vida é feita destas coisas e é assim mesmo: não permite rascunhos para depois passar a limpo. Há que viver intensamente o que a vida tem para nos oferecer porque corremos o risco de não aproveitar os momentos que são verdadeiramente importantes. Estava feliz, mas exausto!
Deixo-vos por agora em silêncio, com o pensamento em Battery Park e algumas palavras do poema “The New Colossus”, de Emma Lazarus:
“Tragam a mim os exaustos, os pobres, as massas confusas ansiando por respirar liberdade”.
Para nós, mais do que uma Estátua da Liberdade a iluminar o Mundo, há que não esquecer que, numa vida bem vivida, cada segundo que passa é uma saudade que fica.
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