As viagens de comboio sempre foram algo que me fascinou.
Durante as minhas viagens, em especial na minha volta ao mundo, muitas e longas viagens de comboio realizei. Foram dias partilhados com pessoas de várias partes do mundo, com culturas diferentes e com vidas repletas de histórias.
É um desses episódios extraordinários, que se passou comigo e o meu amigo Jorge, a bordo do Transiberiano, que partilho convosco:
Eram 3 da manhã e estávamos na plataforma da estação de Tyumen, o sol já ia bem alto e Dima grita para nós: “You are beautiful people”.
Dima foi uma das várias pessoas que marcaram a nossa viagem no transiberiano até Irkutz na Sibéria. Tinha de escrever sobre ele e sobre os outros com quem partilhei este pedaço da minha vida, este troço da minha aventura.
A vida a bordo do transiberiano, para mim, ficou mais marcada pelas pessoas que conhecemos do que pela viagem em si. Elas sim, na minha opinião, caracterizam uma viagem no Transiberiano. E para esse efeito qualquer viagem longa a bordo dum comboio pode ser suficiente. Se não se sai da cabine, se não se conversa com as pessoas a experiência é completamente insípida.
As pessoas vão entrando e saindo ao longo da viagem. Algumas apenas tivemos oportunidade de conhecer por uns dias, outras por toda a viagem. Ao longo destes quatro dias conhecemos muitas pessoas.
Começando por uma das nossas “Provodnitsa” (assistente de carruagem), de nome Tamara. Uma mulher gordinha, loira, que vestia uma farda com saia azul escura e camisa azul-bebé ou branca, tal como todas as outras “Provodnitsa”. Simpática e bonacheirona, acabou por ser uma pessoa com quem travámos amizade ao longo da viagem sem ela dizer uma única palavra de Inglês e eu apenas uma ou duas de russo.
Aliás, sempre que eu agradecia e dizia “spasiba”, ela ria-se muito. Até pensei que estava a dizer mal, mas mais tarde soube por outro russo, o Dima, que digo essa palavra muito bem e sem pronúncia como ele dizia. A outra “Provodnitsa” não era muito simpática mas também estava menos presente que Tamara.
Houve ainda o russo gordo que dormiu duas noites na nossa cabine e fazia mais barulho a roncar do que o próprio comboio. Havia ainda uma equipa de voleibol masculina, toda ela antipática, e um casal americano que sonhava dar a volta ao mundo como nós entre outros.
Nos dois primeiros dias, no corredor do vagão, andavam a brincar umas quatro miúdas, talvez entre os 4 aos 10 anos, com quem me meti. Brinquei com elas um pouco, ensinei-lhes a “dar-me 5” e a partir dai não me voltaram a largar. Duas delas eram irmãs e o pai quando me viu a brincar com elas veio logo apresentar-se e dizer com muito orgulho que eram Ucranianos e não Russos. Esta diferença e este sentimento é algo que se sente imenso. As pessoas nem gostam de ser comparadas.
As miúdas foram saindo e os pais sempre que saiam com elas agradeciam-nos e as miúdas também. Passados 2 dias ficou apenas a Vica que sempre que me via vinha brincar comigo. Foi assim que se manteve connosco até ao nosso destino.
E depois houve o Dima! A pessoa que realmente mais me marcou nesta viagem. Apresentou-se logo no primeiro dia à noite e na manhã do segundo dia, quando demos por ela, já estava a cantar os parabéns ao Jorge.
Era um rapaz grande, musculado, cabeça rapada e olhos azuis. Nasceu em 1978, tal como eu. Essa coincidência deixava-o feliz. Aliás tudo o deixava feliz. Ele confessou nessa tarde que nós éramos os primeiros estrangeiros com que ele tinha alguma vez falado.
Falava inglês suficiente para nos entendermos e para nos ajudar ao longo do dia. Conversámos bastante nesse dia. Ajudou-nos a comprar comida, oferece-nos da sua comida e comprou-nos gelados. Era de facto um rapaz muito simpático. Ao mesmo tempo falava muito com Tamara e quando demos por ela estávamos os quatro sempre a conversar no corredor.
Muito boa malha! Precisamos de mais artigos assim por aqui 🙂