No entanto ambos nos enfrentamos olhos nos olhos com um único objectivo, ele de vender e eu de comprar.
Tenho consciência de que manifestei um sinal claro de fraqueza, ao ter retornado à sua banca, dando indícios claros de que queria a máscara a que preço fosse, mas parecia que todos os caminhos do mercado iam confluir ali.
Estarei eu encantado pela máscara?
Neste momento o regateio já não é uma mera negociação, passou muito para além disso, é quase uma questão de honra.
O meu rosto cerrou-se também, enquanto o do vendedor parece ter aliviado.
Acho o preço pedido inicialmente demasiado exagerado, mas tenho consciência que se praticam vários preços no mercado. Preços para estrangeiros, para locais, para uma ou várias peças, preços bem regateados e mal regateados.
Aquilo que parecia ser a base de licitação para o começo da negociação, passou a ser mais do que isso, passou a ser a ponta do icebergue de um enigma que parecia não ter solução, a não ser aceitar que aquela peça tinha preço único, ao contrário de todas as que estavam no mercado do artesanato.
Tento manter a dignidade da minha proposta, apesar de sentir que não tenho muita escapatória, a não ser aceitar o preço inicial.
Do outro lado, o rosto negro do vendedor, parece menos endurecido que no inicio, apesar de se manter fiel às suas ideias. O jogo parece ter mudado, ele continua sem mostrar empenho em vender, e eu mostro muito interesse em comprar. Sinto que perdi qualquer trunfo que pudesse ter ainda em minha posse.
O vendedor já me conhece o jogo, sentiu as minhas fraquezas, sem que eu me tivesse apercebido das dele, e viu-me cair ao tapete indefeso, para me vencer neste jogo psicológico longo e persistente.
Olho novamente para a máscara, na esperança de me soltar do encanto que me lançou, mas apenas consigo pensar que a quero.
Pousada na banca de madeira, rodeada de estatuetas, telas ou peças de marfim, destaca-se das demais, à primeira vista. Sinto-a novamente por entre os dedos, enquanto levo a outra mão ao bolso e retiro o dinheiro exacto do primeiro valor pedido pelo vendedor.
Amavelmente, retira-me a máscara das mãos enquanto a embrulha cuidadosamente num papel pardo. É uma peça única, bastante frágil, todo o cuidado é pouco para que nada de mal lhe aconteça.
Feliz por poder considerar a máscara minha, aconchego-a contra o peito, e afasto-me da banca com a única peça do mercado, cujo preço não era negociável.
POsso fazer uma pergunta de curioso?
Quanto você pagou pela máscara?
Tenho uma colega que está indo para Luanda, e estou fazendo uma encomenda de artesanato. Justamente uma máscara.
por isso gostaria de uma referência. no preço.
já me disseram que elas não baratas.
Obrigado,
Guilherme Oliveira, São Paulo, Brasil
Olá Guilherme,
Sinceramente não me recordo o valor exato que paguei pela máscara, deverá ter sido algo aproximado de 30 usd.
Para mim esta máscara vale uma memória, e as memórias não têm preço.
Abraço
Pedro Correia
Quando nos sentimos atraídos por alguma coisa, ou algo nos fascina, é difícil tentar resistir. O que sentimos é bem mais forte que a razão e quase impossível de controlar. O texto, muito mais do que uma descrição da compra de uma máscara, mostra-nos os sentimentos que nos inundam quando algo mexe connosco, muito para alem de obter algo, como seu. O importante das coisas que “possuímos” é aquilo que nos transmitem e o prazer que nos fazem sentir, muito mais do que “ter”.
Estatuetas e mãos, gestos e olhares prendem-nos do início ao fim. Temos a sensação de estarmos ali mesmo a assistir a este “Olhos nos olhos”.
Verdadeiramente fantástico!!!
Existem coisas na vida que jamais podem ser contabilizadas!! Tal como esta máscara…