O ar quente acariciava-me o rosto, que tentava proteger com o lenço que me envolvia o pescoço. Lá em cima nas alturas, espiava a paisagem que sobrevoava, num imenso manto de extensão amarelada a perder de vista, até onde a minha visão alcançava.
De relevos ondulantes e mutáveis, ao sabor do vento que tratava de esculpir as dunas a seu belo prazer, ora desenhando uma elevação, ora um vale, numa miscelânea entre a fantasia e a imaginação, sem obedecer a quaisquer regras, que não fossem as ditadas pela natureza.
Jamais seria possível estabelecer um ponto de referência no deserto, as dunas poderão apresentar-se de determinada forma num minuto, para no momento seguinte assumirem um molde completamente diferente.
O deserto cessou, sendo rendido por campos áridos de terra batida, que não são habitados por vivalma. Trilhos monótonos escritos em terra dura, transmitiam a ideia de que passava por cá alguém de quando em vez, não sei vindos de onde e muito menos para que destino.
Deixo o meu corpo escorregar e estendo-me, com a cabeça apoiada nas mãos entrelaçadas que lhe servem de almofada, e observo o céu azul com pequenos rasgos de nuvens esfarrapadas que por vezes o atravessam.
Volto-me ao contrário, e olho novamente para baixo, expectante em relação à paisagem que agora me espera.
Vastas planícies de cereais que dançam ao sabor do vento, ora para um lado, ora para o outro, num vaivém coreografado. Pequenos pontos inquietos anunciam haver vestígios de gente a trabalhar nos campos, que à altura que me encontro não sou capaz de discernir.
Mais à frente as imponentes montanhas do Alto Atlas, com os seus picos afiados e cobertos de neve, rompendo pelos céus desafiando as alturas. Cuidado para não lhes tocar, fiz-lhes um voo rasante.
Sobrevoo extensas áreas sedentas de água, de aspecto austero e inóspito, zonas despovoadas, que nem rodados têm marcado no chão. Mais areais a perder de vista, e ao longe uma mancha verde, quebrando toda aquela paisagem rotineira.
Um oásis suspenso no meio do deserto, exuberante e frondoso, mesmo visto daqui de cima.
Finalmente vislumbro sinais de civilização, o tapete começou a perder altitude e a fazer-se ao solo para aterrar.
Vista de cima a cidade parece um tecido urbano, os terraços dos edifícios estão cobertos de tapetes, não sei se todos voadores ou não, concedendo um colorido único a quem a sobrevoa.
Fez é a mais antiga das cidades imperiais, fundada em 808, consiste em Fès-el-Bali o centro histórico, e Fès-el-Jedid a cidade imperial de Merínidas.
Declarada Património Mundial da Humanidade pela Unesco, é considerada a capital espiritual e religiosa do país.
As suas ruas sinuosas e estreitas são um convite apetecível à descoberta, de rumar sem destino nem direcção procurando o incerto, que se esconde a cada canto, numa porta velha, num sorriso desdentado ou num vendedor ambulante.
Bancas vendem de tudo o que se possa imaginar, desde chás a comida acabadinha de fazer, tentadoras peças de fruta reluzente que me atraem as atenções pelo seu aspecto e aroma, aguçando-me os sentidos.
Perfis ocupados com os seus afazeres comerciais, deambulam numa correria frenética pelas ruelas esguias de calçada, que conhecem como as palmas das suas próprias mãos.
Nas lojas uma parafernal colecção de instrumentos pendurados, desde sacos a objectos de plástico cuja utilidade não consegui descobrir. Transeuntes incansáveis não param de andar de um lado para o outro, numa caminhada incessante, de quem não consegue ficar quieto.
São horas de orar a Alá, no pátio de Mesquita Karaouiyine mais de mil fiéis ajoelhados e virados para Meca iniciam as suas preces.
A Mesquita é uma das mais antigas e mais ilustres do mundo Muçulmano Ocidental, tendo sido durante séculos um dos principais centros espirituais e intelectuais do Islão.
O pátio é revestido por cinquenta mil peças de azulejos zellij, feitas propositadamente para o chão da Mesquita. Os seus telhados íngremes são cobertos por telha verde-esmeralda.
No centro do pátio uma bacia assenta sobre uma fonte de mármore, onde os fiéis vêm fazer as suas abluções, uma preparação essencial para a oração.
A porta da entrada principal possui um grande “mashrabiiyya”, para proteger os fiéis de olhares indiscretos.
A zona Fès-el-Jedid que significa Nova Fez, foi erguida em 1276 por príncipes merínidas como fortaleza contra a ameaça dos rebeldes, e como ponto estratégico para vigiar as suas actividades na cidade velha.
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