Junto ao templo o Grupo das Mil Colunas, situado numa enorme praça que terá servido como mercado, em que as colunas de pedra laboriosamente esculpidas se estendem até perder de vista. Noutros tempos serviram de suporte a um telhado, que hoje já não existe.
Olhei por entre as colunas, e pareceu-me ver o Sr. Tevez inquieto, o grupo parecia ter-se diluído à medida que o tempo avançava. Talvez procurasse algumas “ovelhas” fugidas do seu rebanho. Ocultei-me por entre as colunas, esperando que focasse a sua atenção noutro ponto de interesse, para poder continuar a minha expedição solitária.
Reapareci por cima de uma coluna, perscrutando com um olhar cuidadoso a presença do inquisidor Sr. Tevez, mas não vislumbrei qualquer vestígio seu.
Dirigi-me para o Observatório, conhecido por El Caracol devido à sua escadaria em caracol. Este edifício servia de planetário, com duas plataformas rectangulares o observatório dispõe de uma impressionante escadaria interior em forma de espiral. As fendas na cúpula estão alinhadas com os pontos cardeais, e correspondem a posições de certos corpos celestiais em datas importantes do calendário Maia.
O imenso relvado começava a apinhar-se de gente, de camisas coloridas e chapéus de palha para se protegerem do calor, incluídos noutros “rebanhos”, tendo os seus Srs. Tevez como pastores.
Estanquei na bancada do Campo do Jogo da bola para descansar um pouco, enquanto imaginava os prováveis jogos que ali tinham decorrido. O campo tem uma extensão de 168 metros de comprimento e possui em cada parede lateral um aro esculpido, por onde se fazia passar a bola. Não devia ser uma tarefa fácil, exigia alguma habilidade, dada a altura a que se encontra do chão.
Parado de mãos nas ancas, observava-me com um ar reprovador.
“Realmente”, disse enquanto acenava negativamente a cabeça, as mãos continuavam agarradas às ancas.
“Queres encontrar um Português, está num campo de futebol”, acentuou o tom grave, como se tivesse acabado de fazer algo imperdoável.
“Não é isso, Sr. Tevez, apenas queria estar um pouco só, para viver este lugar mágico”, tentei explicar, sem que o tenha conseguido convencer.
Com todo o grupo finalmente junto, depois do grande esforço dispendido pelo guia, seguimos para a parte norte, até ao Poço Sagrado.
Um enorme abismo negro precipitava-se a nossos pés, com cerca de sessenta metros de diâmetro e uma forma circular, era aqui que se prestavam alguns sacrifícios em nome do Deus da Chuva “Chac”.
Os prisioneiros eram oferecidos a “Chac”, para que este os abençoasse com chuvas durante todo o ano. A altura de vinte e cinco metros provoca calafrios na espinha só de pensar. Os prisioneiros percorriam uma prancha empoleirada sobre o vazio, até se precipitarem num último mergulho nas águas negras do poço. Supostamente “Chac” estaria alojado neste lugar, à tona de água para receber de braços abertos as oferendas.
A manhã já se despedia, e o extenso relvado estava agora quase intransitável, mais turistas que ruínas.
A escadaria do El Castillo era agora uma manta colorida, pelos pólos e t-shirts de todas as cores e feitios.
Parámos no sopé da pirâmide, para refrescar a alma e ouvir uma última explicação do zeloso Sr. Tevez.
Quando olhei para cima, para observar os farrapos de nuvens paradas e suspensas no céu azul, senti-me pequeno perante toda aquela grandiosidade.
Pensei no povo que aqui viveu e nos seus avançados conhecimentos. Donos de uma intelectualidade invulgar, mas ao mesmo tempo brutalmente selvagens. Possuíam uma linguagem própria e uma cultura muito particular, que acabou por ser dizimada pela “civilização” e desbravamento da potência Hispânica.
Cerrei os olhos por breves instantes, e consegui sentir a mitologia do lugar e a sua atmosfera mágica. Os aromas pairavam no ar, enquanto um linguarejar estranho ecoava por entre a multidão.
Com receio, fui descerrando os olhos como se fossem uma persiana abrindo lentamente, pouco a pouco, sem saber o que descobriria à minha frente.
Rostos de outrora pousavam em corpos musculados, que por sua vez vestiam roupas de outras eras. Faces redondas olhavam-me espantadas, pela minha impertinente presença em terras sagradas.
A rolar pela escadaria da pirâmide, algo se dirigia na minha direcção. Quase por instinto desviei-me, para evitar tocar-lhe.
Era apenas uma bola, que uma criança tinha deixado fugir das suas mãos, no cimo da pirâmide.
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