Mantivemo-nos estáticos numa quietude incómoda durante alguns minutos.
Por fim o senhor quebrou o seu pacto silencioso.
“Não iria ver nada, está demasiado escuro”.
A sua resposta intrigou-me ainda mais. Porque quereria ele focar o escuro, o invisível.
Permaneci calado, até encontrar coragem para lhe perguntar.
“Porque está a focar o escuro?”.
Uma gargalhada sarcástica foi projectada, soltando um olhar de esgar que me fez sentir sem jeito.
“Sou um coleccionador de tesouros, meu rapaz”, afirmou secamente.
“Este foi o enquadramento que escolhi, e vou captá-lo em todas as luminosidades do dia”, concluiu.
Agora tinha percebido a razão de permanecer durante todo o dia, naquele local escolhido por si. Fotografava o mesmo local tentando captar todas as luminosidades possíveis, exactamente com o mesmo enquadramento.
A conversa prolongou-se noite dentro, até ficar a saber que tão estimado senhor se chamava James, e era de nacionalidade Canadiana. Passeava pelo mundo conquistando pequenos tesouros, que captava com a sua câmara, fotografando-os durante vinte e quatro horas tentando captar todas as tonalidades do dia.
Segundo me disse, era incrível como o mesmo lugar podia ser tão estranhamente diferente, consoante a incidência de luz que tem em cada hora do dia.
James era um apaixonado pela luminosidade, pelas cores e pelo sol do México, país que intitulava como sendo um dos últimos países mágicos. Segundo ele, este país tinha uma fluorescência que o encandeava.
“Os meus tesouros são os fragmentos que capto”, disse com um ar orgulhoso, estampado no seu rosto embevecido.
Estava decidido a captar o amanhecer, e os laivos vermelhos que se estenderiam pela baía fazendo-a parecer em chamas.
Decidi que estaria bem cedo, antes de o sol nascer, junto ao James e à sua câmara fotográfica, para testemunhar também esse momento.
O despertador tocou quase de seguida.
Cambaleante fui até à casa de banho, lavei os dentes e vesti-me à pressa. O sol ainda não tinha nascido, mas já havia pequenos sinais de luz na rua.
Corri pela baía, ao encontro de James.
A baía tinha realmente uns tons avermelhados mas o local, onde deveria estar James e a sua câmara, estava deserto.
Como seria possível?
O sol nem sequer tinha ainda nascido.
Mas James já tinha partido para outras paragens, na procura de mais tesouros, afinal era um coleccionador.
Partira de Acapulco subtilmente, quase como entrou, sem que ninguém tenha dado por ele.
Quem sabe, já tivesse captado a imagem perfeita.
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