Um crioulo toca o gongo de bronze a anunciar a entrada do novo hóspede. Por essa altura já estou conquistado pela soberba araucária, que faz as vezes de portão, e os arranjos florais de arte japonesa. Haikus floridos gravados em seiva tropical. Cheira a baunilha, antúrios e à flor do frangipani (na medida certa, para não enjoar). Empregados diligentes (dois por cliente) movem-se em surdina para cá e para lá como as folhas das palmeiras. Um deles, de brônzea túnica e manto cor de vinho, traz uma bandeja com duas taças de sorvete (de manga). Assim como vem, assim como vai, voltando outra vez para aspergir o viajante a borrifos de spray Evian.
Sou levado (a pezinhos de lã) até ao quarto do distinto Le Touessrock, miradouro de mar e de lua, de diária estratosférica. A banheira oval na retaguarda da cama (coberta de dois corações moldados a buganvílias) é sedutora para um avant dinner. O quarto é de uma elegância extrema, inspirado num cruzamento feliz de nação crioula e tecnologia de ponta global. Ecrã de plasma, CD, DVD e consolas Playstation são o equipamento do cockpit. Da cama até ao mar são cinco passos curtos e de medida certa (pé 42) sobre areia de filigrana. Óleos kitsch de autor anónimo concorrem com a paisagem: uma língua de areia nua, um mar turquesa até à linha do recife de coral, lugar da fúria das ondas, do clamor, da água viva. Depois, o consolo prosaico do estômago que pode ser repartido por sabores de qualquer parte do mundo.
Vestido a rigor – assim manda o código de calça de linho branca e malha de caxemira, o viajante entrega-se ao vício da gula no Safran, onde brilha o chef Vineet Bathia, do Michelin londrino Zaika. Carta indiana subtil com estética europeia e um resultado inominável. No pós-sobremesa, um charutinho Farias (presente de Adolfo Robaina, velho amigo de Tegucigalpa) deitado à etrusca no canapé com luar de quarto crescente e sinfonia de vagas. Primeiro sono logo ali, ao relento, de olhos semicerrados, hóspede das estrelas, do Cruzeiro do Sol, do território da felicidade.
No dia seguinte, tarde erguer com o canto da cotovia (ou talvez o rouxinol ou outra ave de bel-canto) e uma nova palpitação de felicidade. Que fazer onde nada é suposto fazer-se? Tratar do esqueleto no ginásio de Matt Roberts, o personal trainer das celebridades de Hollywood? Jogar golfe no campo do decano alemão Bernhard Langer, onde só se chega de barco e com santo-e-senha? Entregar-me ao spa das ninfas Givenchy? Felizmente há muitos dias pela frente, para levar à letra o seize the day e livrar-me desta ansiedade aburguesada – nunca esquecendo que burgueses somos todos, cães e gatos. À manhã do terceiro dia, eis a segunda rodada de resorts ou chamar-lhe-ei antes mansões de Zeus, cidadelas do Olimpo?
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